Este tema não tinha tratamento específico na Lei n. 11.101/2005 (LRF), é o que se refere ao processamento da recuperação judicial de grupos de empresas em um mesmo procedimento (consolidação processual), e a chance de apresentação de um único plano de recuperação judicial para as empresas que integram o mesmo grupo econômico (consolidação substancial).
Diante da dificuldade das organizações empresariais, principalmente diante de grupos econômicos, de modo que a legislação falimentar deve prever soluções para a hipótese de a crise econômico-financeira não se restringir a uma empresa apenas, mas a um grupo delas.
A consolidação substancial, tem a capacidade de abarcar a excepcional integração de ativos e de passivos submetidos aos efeitos da recuperação judicial, o que afeta, a personalidade jurídica e a separação patrimonial das empresas.
A consolidação substancial, ainda que reconhecida pela jurisprudência, era realizada sem a observação de critérios pré-definidos, o novo art. 69-J busca trazer mais segurança à sua aplicação, estabelecendo requisitos que devem ser respeitados pelo juiz e pelos devedores.
Segundo o dispositivo, a consolidação substancial ocorre quando se constatar a interconexão e a confusão entre ativos e passivos dos devedores, de modo que não seja possível identificar a sua titularidade sem excessivo gasto de tempo ou de recursos, cumulativamente com a ocorrência de, no mínimo, 2 (duas) das seguintes hipóteses: I) existência de garantias cruzadas; II) relação de controle ou de dependência; III) identidade total ou parcial do quadro societário; e IV) atuação conjunta no mercado entre os candidatos.
Na medida em que haverá a reunião de ativos e passivos dos devedores, o plano de recuperação judicial a ser apresentado é único e sua rejeição provoca a convolação em falência de todos os devedores que estejam em consolidação substancial.
A indicação de requisitos para a consolidação substancial é positiva, de forma que caberá à jurisprudência e a doutrina determinar a correta interpretação que a eles deve ser dada. Contudo, o art. 69-J também apresenta problemas, já que não foi claro sobre a necessidade, ou não, de a consolidação substancial ser aprovada pela assembleia-geral de credores.
Isso porque, ao estabelecer que o juiz “poderá, de forma excepcional, independentemente da realização de assembleia”, autorizar a consolidação substancial, induz o entendimento de o juiz poderá autorizar dependendo do que a assembleia decidir. A lei, aparentemente, “teria criado duas possibilidades de admissão da consolidação substancial: (I) de forma excepcional, pelo juiz, sem ouvir a assembleia e (II) de forma ordinária, dependendo da decisão da assembleia”.
A jurisprudência não possui entendimento firmado sobre o tema, pois, em alguns casos, considera que os credores devem ser previamente consultados sobre a apresentação de um plano único, enquanto em outros, ordena a apresentação unitária do plano, sem passar pelo crivo da Assembleia Geral de Credores.
A Lei 14.112/2020 perdeu a oportunidade de pacificar a controvérsia, de forma que os Tribunais deverão utilizar dos mecanismos de uniformização da jurisprudência para definir se a decisão sobre a consolidação substancial caberá exclusivamente ao juiz, ou se será necessária a aprovação da Assembleia Geral de Credores.
Contudo, mesmo com a inclusão do art. 69-J à LRF, permanecem as dúvidas acerca da possibilidade de a consolidação substancial ser objeto de deliberação pelos credores em Assembleia ou se esta deverá ser deferida unicamente pelo Juízo, quando presentes os requisitos legais.
Na jurisprudência do TJRJ, verifica-se a existência de ambos os posicionamentos, entende-se que os credores devem ser previamente consultados, conforme a conveniência financeira desta unificação. Já em outros Tribunais a consolidação substancial é deferida sem passar pelo crivo dos credores, considerando a existência de grupo econômico e a inexistência de prejuízo aos credores com a unificação dos planos. Por exemplo, na recuperação judicial do Grupo Odebrecht, determinou-se a deliberação dos credores em Assembleia, sobre a consolidação dos planos, desde que fosse respeitada a independência das recuperandas na votação, nos termos do art. 45 da LRF.
Portanto, a regulamentação prevista na Lei nº 14.112/2020 é assertiva, pois estabelece os requisitos que devem ser observados pelo juiz para o deferimento da consolidação substancial.